Obediência a Deus como Princípio
Entre as diversas revelações que nos fez o recenseamento há pouco tempo realizado no Brasil, destacam-se algumas que, fugindo ao sentido exclusivamente material da vida, formulam novos problemas para o espírito.
O advento de uma nova seita religiosa entre nós, e já com ramificações em todas as capitais sul-americanas e em diversas cidades gaúchas, despertou a curiosidade da reportagem de conhecer os fundamentos doutrinários.
Daí a visita que fizemos, ontem, ao Sr. Julio Ugarte y Ugarte, seu fundador e seu chefe.
Sem qualquer exterioridade digna de nota, o criador da "Igreja Cristã Primitiva", - tal é o título da nova seita - é um homem de estatura mediana e expressão cheia de serenidade.
Atendendo à reportagem, declarou S.Sa.:
"A finalidade principal da sociedade que oriento é a organização da Igreja Cristã Primitiva, tendo como fundamento o Evangelho de Cristo, que ensina a Doutrina de Obediência à Vontade Divina e aos Seus Estatutos.
Somente admitimos como adeptos as pessoas que renunciam à sua vontade pessoal para sujeitar-se à de Deus, Único Senhor de todas as coisas. Fazemos, assim, a unificação da vontade humana em torno da Lei Divina.
Admitimos a manifestação espiritual de Jesus Cristo, de acordo com as Suas Palavras: - "O que tem os Meus Mandamentos e os guarda, esse é o que me ama; e o que me ama, será amado de Meu Pai e Eu o amarei e me manifestarei a ele."
A Doutrina de Obediência a Deus é essencialmente uma prática interna, espiritual, em que os adeptos, em todos os seus atos, fazem - não a sua vontade pessoal, - mas a Divina.
Segundo o conselho evangélico, procuramos não fazer a vontade dos pensamentos, nem os desejos da carne, porque os anulamos em sua origem; tudo se faz simplesmente pela Vontade de Deus. Anulamos as causas secundárias, pela unificação completa com as primárias, porque nem sempre os motivos aparentes são os mais poderosos."
O Ritual
"O nosso culto externo - continua o Sr. Ugarte, - difere dos demais e somente é possível encontrar alguma semelhança com o realizado nas igrejas protestantes, se admitirmos, a mais, os fenômenos de vidência e audição. Não invocamos espíritos, o que não impede que aceitemos a possibilidade das manifestações espíritas. Em nossas reuniões, somente oramos o "Pai Nosso", única oração ensinada por Cristo, Único Espírito que podemos invocar, porque "Quando duas ou mais pessoas se reunirem em Meu Nome, Eu estarei no meio delas".
Procuramos desenvolver em cada um de nós o "Cristo Interior", mediante a prática da Obediência a Deus, e desenvolver o nosso poder de ver e ouvir espiritualmente, como nos primitivos tempos do Cristianismo, quando todos os cristãos, segundo diz o Evangelho, eram videntes e auditivos.
Esse "Cristo Interior" se desenvolve em cada um dos nossos fiéis, à medida de seu progresso espiritual.
Não adoramos imagens porque, estando Deus presente em toda a parte, não precisamos recorrer à adoração de ídolos feitos pela mão humana e, principalmente, obedecendo o preceito evangélico: "Não adorarás imagem alguma, senão ao Senhor teu Deus, em Espírito e em Verdade."
Praticamos, mas, espiritualmente, a Comunhão ou Eucaristia, porque "Deus dará de Seu 'Espírito' aos que Lhe obedecem".
Os novos adeptos recebem a Confirmação, depois de certo tempo de prática da Obediência a Deus, segundo Sua Vontade expressa no Evangelho. O Batismo também é feito de forma espiritual, só pode ser realizado em pessoas adultas e conscientes. Não o fazemos com água, porque os Apóstolos o fizeram com o 'Espírito Santo'. O Batismo de Jesus, feito com água, não foi mais que simbólico; mesmo porque Ele já recebera o Espírito Santo, quando menino. Em nosso templo, admitimos somente a Cruz, como símbolo da fé. Aceitamos a reencarnação, como base fundamental da Justiça Divina.
As finalidades imediatas da Doutrina são as seguintes: Reunir, dentro de um laço indissolúvel de fraternidade, pessoas de ambos os sexos, sem distinção de nacionalidade, cor ou posição social, que aceitem a Doutrina de Obediência a Deus; difundir pela palavra falada e escrita, o Primitivo Culto Cristão e, finalmente, promover o aperfeiçoamento moral de seus adeptos e da humanidade, pelo combate ao fanatismo, ao vício e ao crime.
(*) Publicado no Correio do Povo em 23 de novembro de 1941.