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Mais de Uma Centena de Curas Extraordinárias

A fé volta a fazer milagres ("O Homem Moderno")

 

Seis horas da manhã de domingo último. Convidado pelo Professor Julio Ugarte, o jornalista prepara-se para a viagem que o levará até a estação "João Rodrigues", no município de Rio Pardo, onde se realizariam festejos comemorativos do 2º aniversário de fundação, ali, do "Templo São Pedro", ramo da Igreja Cristã Primitiva, cuja sede foi instalada nesta Capital, à rua Clara, nº 327.

A viagem e a palestra foram iniciadas no mesmo instante, quando o trem atravessava os bairros proletários da cidade, ainda adormecidos...

A título de apresentação, diremos que o Professor Ugarte não apresenta exterioridades que justifiquem a extraordinária potência psíquica de que somos, agora, testemunhas. A sua aparência é simples e de sua palestra é fácil deduzir um profundo conhecimento de assuntos religiosos, sempre abordados pausadamente, como se pretendesse pesar e medir cada uma das palavras que pronuncia com acentuado sotaque castelhano.

Os leitores terão, nas linhas seguintes, um singelo resumo do que ouvimos durante a viagem:

"O homem moderno é incorrigivelmente cético. As concepções materialistas dominam o Mundo e têm sido inúteis aos chamamentos dos orientadores de todas as seitas religiosas para o seu regresso à obediência da lei divina.

"Ver para crer" é a frase que lhe serve de escudo à incredulidade e não foram encontrados, ainda, argumentos capazes de destruir esse monumento de descrença que ela traduz...

Culpados? Seria inútil procurá-los. Esse quase ateísmo é uma decorrência lógica do nosso estágio de civilização. O homem do século, tendo dominado um certo número de leis físicas e pondo, mesmo, a seu serviço, a própria natureza, adquiriu uma exagerada consciência de sua força. Daí, o orgulho que caracteriza todas as suas atitudes e que é, igualmente, a prova mais expressiva de sua flagrante inferioridade espiritual.

Há os que dizem crer em Deus. Mas essa afirmação é mais um elo tradicionalista que os liga ao passado, que a expressão de aspirações ou convicções íntimas, nascidas de coisas presentes. Hoje não se ama a Deus: Simplesmente teme-se o castigo ameaçadoramente prometido a cada instante... Não é mais o amor que conduz as almas para o Céu; mas o temor do Inferno e de suas penas. Deus, para os contemporâneos, deixou de ser o supremo bem, o amor eterno, a harmonia absoluta, para transformar-se numa espécie de autoridade prepotente e sem entranhas, que todos temem, mas que não se pode amar.

É apresentado aos homens como "fonte de todo o bem e de todo o amor". No entanto, afirma-se que imaginou um lugar de martírios indescritíveis, onde os pecadores sofrerão eternamente o castigo de suas faltas humaníssimas. É a fonte de todo o Bem, jorrando o mal absoluto e sem remédio, num contraste chocante e absurdo.

E a humanidade - continua o Professor Ugarte - não pode queixar-se de ter sido esquecida pela divindade. De tempos em tempos surgem, aqui e ali, as provas de existência de forças desconhecidas, procurando despertá-la de seu sonho de orgulho. A história das religiões está cheia de fatos inexplicáveis. Não que eles o sejam realmente, mas porque a vaidade não permite ao homem a crença em coisas que se não possam adaptar às suas leis mecânicas, ainda ingênuas, em que pese a grandiosidade da civilização de seu tempo.

E o ceticismo continua produzindo os seus frutos. O homem procura marchar, mas não sabe para onde. Falta-lhe um objetivo, um fim, um destino que só será encontrado quando ele compreender e submeter-se à Verdade Eterna e Imutável da Lei Divina, reiniciando o regresso à origem de tudo, que é Deus...

Não o Deus que castiga, mas o que perdoa. Não o que reserva torturas eternas aos que cometem faltas que poderiam ser imputadas à fragilidade humana mais que à sua maldade; mas ao pai eterno, que guarda um lugar no ceio amantíssimo para cada um de seus filhos...

Assistimos hoje ao primado da matéria e do instinto, sobre os sentimentos plantados em nossas subconsciências, em 20 séculos de pregação cristã.

O homem acorrentou o seu espírito a uma série de desejos insaciáveis, onerando a sua felicidade presente e futura com as conseqüências desse erro...

E os resultados aí estão, lamentáveis, mas lógicos: A força impondo-se à fé e à virtude, e a mocidade arrastada aos campos de batalha, por um determinismo mais poderoso que a vontade dos homens, míseros joguetes de seus próprios vícios.

E por quê? Porque deturparam a Lei de Deus ao sabor de seus interesses; porque a fizeram cúmplice de desejos e anseios impuros, esquecidos de que Ela perdoa mas só depois que os pecadores sofram as conseqüências de suas próprias culpas. A punição, assim, não vem de Deus, mas de nós mesmos, dos nossos desmandos e do nosso orgulho. Ele não criou o castigo, porque a sua bondade absoluta não pode desabrochar em sofrimentos. Isso seria um contra-senso e Deus é, antes de tudo, a suprema harmonia. A humanidade não cessa de plantar erros e absurdos, e estranha depois as sucessivas colheitas de catástrofes, como se lhe fosse possível esperar outra espécie de frutos.

E seria tão simples conseguí-lo. Bastaria que o homem se espiritualizasse o suficiente para merecer a bondade divina, através de manifestações comuns a um certo número de eleitos, em que pese o sorriso da dúvida dos que não acreditam senão em coisas que se possam traduzir em cifras.

A Lei de Deus é simples como a água que jorra da montanha e não se presta a interpretações contraditórias. Basta um pouco de boa vontade para que o homem compreenda a verdade eterna encerrada nos ensinamentos cristãos.

Mas a vaidade humana não permitiu que eles se mantivessem puros como a sua origem, através das idades. Pretensos apóstolos e falsos orientadores espirituais do Mundo transformaram os seus detalhes essenciais, as suas linhas mestras, ao sabor de interesses que não devem ter morada entre os que se dizem seus discípulos.

Surgiu a confusão e - inevitavelmente - a "Torre de Babel" aí está, feita um gládio, apunhalando o coração do Mundo.

Os homens não entendem, porque se julgaram capazes de criar leis mais sábias que as divinas. No livro de minha autoria 'As Duas Grandes Leis Espirituais', que você poderá encontrar nas livrarias, a primitiva doutrina de Cristo é apresentada tal qual Ele a ensinou aos seus apóstolos.

Infelizmente, ainda não foi possível difundi-la bastante, não somente porque os homens não se querem dedicar às coisas do espírito, como - e principalmente - pela oposição tenaz de certos meios. Você verá, breve, que a divulgação do Bem que Deus fez a centenas de criaturas, por meio deste Seu servo, provocará uma reação imediata e violenta, cuja extensão não pode ser prevista.

Dirão, talvez, que vem do Inferno o poder que se manifesta em mim, que não sou mais que um explorador da ingenuidade pública, como se eu visasse algum proveito material, fazendo o bem a todos os que sofrem. Serei perseguido e injuriado e é possível que não possa permanecer entre os que hoje ouvem a doutrina de Cristo através das minhas palavras.

Porque o homem esqueceu a sua origem divina e voltou a adorar o "Bezerro de Ouro" de que fala o Evangelho. Uma doutrina que se apresente sem exterioridades suntuosas, monumentos de mármore, altares repletos de objetos caríssimos e outras futilidades idênticas, não pode ser levada a sério pela multidão contemporânea. Porque ela esqueceu, talvez, que Cristo escolheu um ambiente diverso, pregando o desprezo dos bens materiais, a humildade e a singeleza, durante o cumprimento de sua missão na terra... Mas isso não implica na condenação da humanidade, porque outros tempos virão apresentar aos nossos olhos um panorama diverso. As grandes catástrofes, que destroem os pretenciosos monumentos do poder humano, purificam os seus construtores preparando o advento de novas eras e plasmando a formação de mentalidades cada vez mais acessíveis aos ensinamentos que, mais cedo ou mais tarde, alicerçarão as relações humanas, orientadas pela bondade e pelo amor que se irradiam dos verdadeiros ensinamentos de Cristo".

A dor é o banho lustral das almas. E, se é certo que devemos sofrê-la com paciência, não o é menos que devemos abençoá-la, porque somente ela é capaz de fazer compreender o sentido exato de uma palavra que centraliza todas as nossas aspirações que é "Felicidade". Sem ela, a vida humana não teria sentido algum. Faltaria a consciência ou a ciência de ser possível viver melhor, ocasionando o desaparecimento do estímulo que empresta ímpeto à nossa marcha. Não teríamos aspirações de coisas melhores pela inexistência de uma base para julgamento. E o Mundo se transformaria em uma espécie de estação intermediária, onde nada teríamos a fazer senão aguardar o prosseguimento da grande viagem para o desconhecido.

A missão do homem na terra é, assim, aprender a razão de seus sofrimentos, através dos ensinamentos de que são pródigas as dores que o assaltam constantemente. Quando ele compreender que elas, longe de representarem um castigo imposto por Deus, não são mais que as conseqüências de seus próprios erros, estará chegando o tempo de ser feliz.

Não será fácil a viagem até lá. Antes, é indispensável que os homens desenvolvam o seu "Cristo Interior" pela fiel observação dos ensinamentos divinos, transformando-se no "Homem idealizado por Ele".

 

Na Estação de João Rodrigues

Um apito demorado interrompe a palestra. Ouve-se o rugido surdo das poderosas travas do comboio; a velocidade diminui rapidamente e, instantes após o Professor Ugarte recebia os abraços de numerosas pessoas que o aguardavam na gare.

Seguimos, então, para a residência do senhor João Manoel Nunes, situada a cerca de 500 metros da estação, onde encontramos ainda, inúmeras outras pessoas residentes no povoado ou em suas imediações, desejosas de abraçar "o Mestre", como é chamado ali o nosso companheiro de viagem. Seguiram-se apresentações e o jornalista, momentos depois, sentia-se perfeitamente à vontade, estimulado pela encantadora espontaneidade das gentilezas de que foi pródiga a família Nunes.

A chegada do Professor Ugarte movimentou o vilarejo. De momento em momento, a palestra, já generalizada, era interrompida pela chegada de adeptos da Igreja Cristã Primitiva, apresentando boas vindas ao seu orientador. E aquela espécie de audiência coletiva se prolongou até tardias horas da noite de domingo.

Na manhã de segunda-feira, data em que se comemorava o 2º aniversário da fundação do Templo São Pedro, naquela localidade, cerca de 200 pessoas, entre as quais inúmeras senhoras e senhoritas, se adensavam nas proximidades do pequeno templo, insuficiente para contê-las todas.

Às nove horas teve início o programa de festividades, com o hasteamento da bandeira nacional, após uma rápida exposição de seu simbolismo. O hino pátrio foi cantado por todos os presentes, sendo interessante registrar que, naquele povoado, nunca fora ele cantado em público e nem fora hasteado o pavilhão do Brasil.

Já, então, com a contínua chegada de fiéis procedentes, alguns, de locais situados a três e quatro léguas de distância, e mesmo de Rio Pardo e Ramiz Galvão e outros, o seu número ultrapassa 300. A cerimônia inicial foi rápida: Hasteada a bandeira e cantados os últimos versos do hino nacional, a multidão dirigiu-se para o local onde alguns gaúchos assavam um gordo churrasco, destinado ao almoço dos fiéis.

 

Mais de uma Centena de Curas Milagrosas

Foi então que começou o nosso espanto. Enquanto era esperada a hora do almoço, a multidão, dividida em numerosos grupos, palestrava animadamente. Fazendo parte do maior deles, onde o Professor Ugarte centralizava a palestra, tivemos a oportunidade de assistir narrativas que não repetiríamos, não fora a incontestável idoneidade de seus autores, reforçada pelo testemunho de cerca de trezentas pessoas.

Seria ocioso alinhar aqui o nome das pessoas curadas pelo poder espiritual do chefe da Igreja Cristã Primitiva. Ocioso e inútil. Bastará dizer que muitas delas residem em Porto Alegre e estão prontas a dar todas as provas da realidade do que afirmamos. Também na cidade de Rio Grande, onde existe um Ramo da nova doutrina, residem pessoas curadas e dispostas a dar o seu testemunho.

Mas é em "João Rodrigues" que reside o núcleo mais forte de fiéis que já receberam a saúde, milagrosamente, das mãos do Professor Ugarte. Podemos afirmar que não existe uma única família naquele local, ou num raio de três léguas, que não tenha um ou mais membros diretamente beneficiados pela sua extraordinária potência psíquica.

E foi ali que tivemos oportunidade de ouvir cerca de 100 pessoas, narrando as curas mais inacreditáveis: Uma senhora, paralítica há mais de cinco anos, caminhou a um simples convite e há mais de dois anos trabalha incessantemente, sem a mais leve manifestação de sua antiga moléstia; outra, residente na Estação Engenheiro Pestana, nas proximidades desta capital, foi paciente de melindrosa intervenção cirúrgica, feita mediunicamente e goza de perfeita saúde.

E as narrativas se sucediam: Um cidadão, residente em João Rodrigues e recolhido ao Hospital São Pedro, onde estava há mais de um ano, foi levado ao Templo da Igreja Cristã Primitiva desta capital, à rua Clara, 327, de onde saiu completamente curado, instantaneamente. Outro, ainda, toma a palavra: "Meu filhinho estava mal. Os médicos não acertavam com sua moléstia. O Mestre chegou e ele ficou bom no mesmo momento. É este aqui".

E ainda outro: "Minha senhora vivia doente. Gastei dezenas de contos de réis com médicos e viagens. E tudo inutilmente. Uma pessoa amiga falou nas curas feitas pelo Professor Ugarte: Procurei-o, e ela está ali, auxiliando a receber os hóspedes, E nunca mais sentiu nada".

Apresenta-se outro: "Feri uma vista quando trabalhava na roça. Estava cego, pois a outra já era inutilizada. Um amigo me trouxe à presença do Professor Ugarte e fiquei bom".

E seguiu-se uma sucessão interminável de narrativas, todas elas com o epílogo invariável: "Estou bom, e nunca mais senti nada". Ante o espanto do jornalista, continuava o desfile das mais terríveis e variadas doenças e das curas milagrosas, que eram o ponto final de todas elas.

Não havia como duvidar de coisa alguma. As provas estavam ali mesmo, ao alcance e até oferecendo-se à reportagem e só não publicamos as fotografias de diversos curados, porque, infelizmente, não permitiu um defeito surgido, no momento, na Kodak de que dispúnhamos.

Demais, esses milagres não ocorreram no outro lado dos mares, mas aqui mesmo em Porto Alegre e em João Rodrigues, há quatro horas de viagem. Os descrentes podem "ver para crer", se o desejarem.

 

O Povoado "João Rodrigues"

Já que se nos depara a oportunidade, diremos que o povoado de João Rodrigues, onde se passam os fatos extraordinários narrados nesta reportagem, está, ainda, em seu primeiro período de formação.

A casa de residência do sr. João Manoel Nunes, que pode ser considerado o seu pioneiro; o prédio do Templo São Pedro e oito ou dez pequenos chalets, onde residem algumas dezenas de pessoas. Projeta-se ainda a construção do prédio para um grupo escolar.

A população, em sua grande maioria, entrega-se aos trabalhos agrícolas. O senhor João Manoel Nunes é fazendeiro e os seus filhos dedicam-se à exploração da rizicultura.

Por ocasião da visita, nossa reportagem foi informada de que algumas pessoas projetam construir casas nas proximidades do Templo, delineando-se, assim, o seu papel como núcleo do povoamento.

 

 

(*) Publicado no Correio do Povo em 15 de fevereiro de 1942.

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